Darryl Bailey: como uma nuvem

Você não precisa aprender aprender a deixar a vida fluir; há apenas o fluir. Você não existe como algo separado disso.

Matéria parece se tornar energia; energia parece se tornar matéria; líquido parece se tornar gás; gás parece se tornar líquido; calor parece se tornar frio; frio parece se tornar calor; e por aí vai.

Mais precisamente, não há uma coisa chamada matéria se tornando outra coisa chamada energia, da mesma forma que não há uma coisa chamada primavera se tornando outra coisa chamada verão. Essas são meramente as aparências passageiras de uma não-forma pulsante e emergente.

É como uma nuvem: em um momento ela se parece como uma pessoa e, em outro, com uma casa. A nuvem está simplesmente mudando de aparência, nunca se tornando nada mais do que uma nuvem. Toda a existência é esse mesmo movimento, aparentando ser várias coisas, mas nunca sendo mais do que um acontecimento sem forma.

Darryl Bailey em Essence Revisited

Foto: Łukasz Łada

Darryl Bailey: despertar espiritual

É possível, para aqueles que se interessam, perceber que somos um movimento da existência em si mesma. O mesmo movimento que aparece como estrelas no céu noturno ou nos voos migratórios de pássaros selvagens.

Nós agora aparecemos dessa forma, mas podemos da mesma forma aparecer como uma pitada de pó ou uma gota de umidade, e nós iremos, em algum momento; somos um acontecimento sem nenhuma forma específica.

Despertar espiritual é a abertura ao que realmente é, ao seu mistério, aparecendo como isso ou aquilo, sempre se movendo, mudando, não sendo nada em particular.

Liberdade é ser essa vitalidade indefinível, sem a tensão ou o esforço de precisar ser algo a mais do que isso. Isso não encerra as dores e dificuldades da vida; simplesmente acaba com a ilusão de que qualquer parte dela esteja sendo compreendida ou direcionada.

Darryl Bailey em Essence Revisited

Foto: Patrycja Chociej

Darryl Bailey: evento mágico

Se você se sentar e não fizer nada, a natureza básica da vida se expressa claramente. (…) Todas os grandes ensinamentos espirituais, no fim, apontam para isso, não importa o que mais eles possam oferecer. Seja isso chamado de meditação, satsang, não-fazer, consciência pura, oração silenciosa, fé, posição do cadáver, apenas sentar, descansar no momento e por aí vai, não importa. Em todos os casos, o convite é para que você não faça nenhum esforço, e a vida pode se revelar como o evento mágico que de fato é.

A crença na forma e em um fazer pessoal podem se dissolver, e o acontecimento vibrante e indefinido que tudo é se torna óbvio. Em algumas tradições, dizem que só há Deus ou Atman, mas esses são simplesmente rótulos para a vitalidade inexplicável que a vida é. Chame-a do que você quiser; isso é parte da dança.

Darryl Bailey em Essence Revisited

Foto: Greg Johnson

Darryl Bailey: decisões

Quando éramos um óvulo fertilizado no ventre, não decidimos crescer ou viajar útero abaixo. Fora do ventre, não decidimos começar a crescer, pensar, andar ou falar. Nenhum “self” direciona nada disso; apenas acontece no fluxo compulsivo da natureza.

Não criamos os nossos corpos e não criamos os nossos cérebros. Não criamos as capacidades físicas, mentais ou a falta de capacidades, nós as somos. Não criamos necessidades e interesses aparentes, ou preocupações que surgem num dado momento. Tudo isso simplesmente acontece por conta própria.

Não podemos arbitrariamente decidir ser alguma outra coisa, ser um corpo ou um cérebro diferentes, um conjunto diferentes de capacidades físicas e mentais, diferentes necessidades, interesses e preocupações. Ainda que pareça que tomemos decisões, elas crescem das necessidades, interesses e preocupações que surgem num certo momento. Não há um “self” que faz com que elas aconteçam.

A natureza apresenta situações que demandam uma decisão e a resposta a essas situações é um movimento do corpo, necessidade, interesse e capacidade que a natureza também apresenta.

Nós não temos esse corpo, necessidade, interesse e capacidade; nós somos esse corpo, necessidade, interesse e capacidade. De novo, se você se sentar e não fizer nenhum esforço, o movimento que você é se expressa bem claramente — a dança de pulsações, vibrações, pensamentos, humores, necessidades, interesses e por aí vai — mas não há nunca a experiência de alguma coisa possuindo esse movimento.

Darryl Bailey em Essence Revisited

Foto: Karina Maslina

Darryl Bailey: movimento

Queremos que a vida seja algo específico — algo agradável, algo definido, algo estável e seguro — um jeito específico de ser. Mas a existência não é nada em específico. Existe apenas um evento que muda constantemente, a ausência de qualquer forma intrínseca.

A crença numa forma constantemente se choca com o movimento da existência, e esse movimento sempre quebrará qualquer falsa impressão de estabilidade, deixando sentimentos de frustração, confusão e mágoa.

Se, entretanto, realiza-se que essa chamada “coisa”, incluindo você, é na verdade movimento, não há expectativa de estabilidade; não há nunca nenhuma forma a se segurar ou compreender. Há simplesmente uma dança mágica de aparências que sempre mudam.

Darryl Bailey, em Essence Revisited

Foto: Hulki Okan Tabak

Stephen Batchelor: dogma

O verdadeiro valor de qualquer dogma ou crença está na sua capacidade de apontar para além de si mesmo, na direção de uma realidade mais profunda e que não pode ser facilmente articulada numa fórmula simples. Assim que o seu caráter simbólico de auto-transcendência é negado, e a crença é elevada ao status de verdade final e universal em si mesma, o seu significado espiritual genuíno é perdido, e ela é reduzida a um mero “dogma”, no completo senso pejorativo da palavra.

Stephen Batchelor em Alone With Others: An Existential Approach to Buddhism 

Foto: Timothy Eberly

Jiddu Krishnamurti: ganância

O que está resistindo à ganância? Essa é a primeira pergunta, não? Por que você resiste à ganância e quem é a entidade que diz: “preciso me livrar da ganância”? A entidade que diz: “preciso me livrar” também é ganância, não é? Até agora, a ganância compensou, mas agora é dolorosa; sendo assim, se diz: “preciso me livrar dela”. O motivo pra se livrar dela também é um processo de ganância, pois está se querendo ser algo que não é. Não ter ganância agora é desejável, então estou perseguindo a não-ganância; mas o motivo, a intenção, ainda é ser algo, ser não-ganancioso — o que, certamente, ainda é ganância; ainda é uma forma negativa da ênfase no ego.

Jiddu Krishnamurti em The First and Last Freedom

Foto: Tim Mossholder

Jiddu Krishnamurti: o self

O self é um problema que não pode ser resolvido pelo pensamento. É preciso que haja uma consciência para além do pensamento. Ter consciência, sem condenação ou julgamento, das atividades do self — apenas estar consciente é suficiente. Se você estiver consciente para resolver um problema, para transformá-lo, para produzir um resultado, então você ainda está no campo do self, do pequeno “eu”. Enquanto estivermos buscando um resultado, seja por análise, por atenção, por um exame constante de cada pensamento, ainda estaremos no campo do pensamento, que está dentro do campo do pequeno “eu”, do ego.

Jiddu Krishnamurti em The First and Last Freedom

Foto: Wolfgang Hasselmann

Barry Magid: guerra contra nós mesmos

Cada vez mais, vejo estudantes cujo objetivo secreto na prática é extirpar alguma parte indesejada de si mesmos. Algumas vezes é a sua raiva, outras vezes a sua sexualidade, sua vulnerabilidade emocional, seus corpos, ou às vezes suas próprias mentes, que são vistas como fonte do seu sofrimento. “Se ao menos eu pudesse, de uma vez por todas, me livrar de…” Tente preencher a lacuna você mesmo. Essa atitude frente à prática, se não questionada, leva os estudantes a uma anorexia espiritual (e às vezes, literal): a prática se torna uma forma arrogante de eliminar aspectos que detestamos em nós mesmos. Nosso ódio pela nossa mortalidade e imperfeições físicas alimenta uma guerra contra nossos corpos, em que tentamos transformá-los em máquinas invulneráveis que aguentam qualquer coisa, ou descartá-los como cascas irrelevantes que meramente abrigam um self interno, verdadeiro, idealizado. Entramos em guerra contra nossas próprias mentes, tentando bloquear as emoções ou pensamentos totalmente, como se pudéssemos descansar finalmente num vazio sem problemas. Queremos que a prática seja uma forma de lobotomia mental, removendo tudo que nos assusta ou envergonha, talvez removendo o próprio pensamento.

Barry Magid em Ending the Pursuit of Happiness

Foto: Christopher Campbell

Jiddu Krishnamurti: relacionamentos

Os relacionamentos são buscados de forma e se ter segurança, onde você, como um indivíduo, pode viver num estado de segurança, de gratificação, de ignorância — e tudo isso causa conflito, não causa? Se você não me satisfaz e eu estou buscando satisfação, naturalmente haverá conflito, pois estamos ambos buscando segurança um no outro; quando essa segurança fica incerta, você se torna ciumento, violento, possessivo e por aí vai. Então, o relacionamento invariavelmente resulta em posse e reprovação, em demandas autocentradas por segurança, conforto e gratificação, e nisso, naturalmente, não há amor. Sendo assim, o relacionamento tem muito pouco significado quando estamos apenas buscando gratificação mútua, mas se torna extraordinariamente significativo quando é uma forma de autorrevelação e autoconhecimento.

Jiddu Krishnamurti em The First and Last Freedom

Foto: Elizabeth Tsung